domingo, abril 18

- a porta


- A Porta
 Meu maior problema foi gostar de mulheres. Nunca me apaixonei nem nunca amei uma pessoa, pelo menos aquele amor e aquela paixão adequada às pessoas normais, que desejam casar e ter filhos. Nunca namorei, também não sei o que é isso, exatamente. Meu problema sempre foi gostar de mulheres. Mas não daquela forma, que todos os homens gostam. Peitos, bunda, coxas. Sempre me senti atraído por aquele mistério que envolve a grande maioria delas, os sorrisos e as covinhas que se formam em seus rostos ou em suas costas.
 Sou fraco e sempre serei assim. Forte mesmo é o cara que se humilha de amor, é miserável de paixão, escolhe sofrer por uma mulher ao invés de usá-la, da forma mais literal possível. Não quero ser arrogante, nem contar vantagem. Mas eu poderia ter a mulher que quisesse. Nova, velha, casada, solteira, idealista ou fútil. Eu sempre soube o que fazer quando se tratava do sexo oposto, pelo menos até onde eu me propunha a me relacionar. Toda mulher é carente, toda mulher gosta de receber um elogio, não precisa ser sincero, pelo contrário. Toda mulher quer ser, exatamente o que não é. Pelo menos sempre trabalhei em cima disso para conquistá-las. Então se o alvo é fútil, diga que ela é inteligente, da mesma forma chame de cheirosa e elogie a roupa daquela que não se importa muito com isso. Mas enfim. Uma, entre tantas mulher me tirou o chão, por algumas semanas, é verdade. Mas foi a única e me despertar euforia e, também, raiva.
 Conheci essa mulher em um bar, nenhuma das minhas abordagens funcionou muito bem, pra falar a verdade, não funcionaram nada. Era ela que brincava comigo, não o contrário, ela pagou o próprio drinque e quase o meu, talvez para me irritar. Eu estava um pouco alto, o perfume dela me distraia e, quando vi, já estava na 4ª dose do meu amigo José. A música alta e as luzes (na realidade, não haviam muitas) me deixavam ainda mais absorto nela. Sem notar, após um ou duas horas conversando, eu tentando, desesperadamente, ganhar aquela mulher e ela divertia-se com coisas que eu falava (que, alias, acho que nunca cheguei tão perto da sinceridade) então, de repente, ela me olhou de uma forma, como se me conhecesse, e foi nesse momento que tudo que eu acreditava fraquejou, pela primeira fez. Então eu fiz minha escolha, como em qualquer filme barato, eu conversei comigo mesmo, ou pelo menos fui juiz do debate da minha consciência. Uma parte dizia para sair dali, naquele mesmo instante e a outra, bem, eu a ouvi e fiquei.
 Quarenta minutos depois, eu estava em seu apartamento, completamente perdido entre nossos beijos. Ela fez tudo que eu quis, ou foi o contrário, não tenho certeza. Mal conseguimos chegar à cama. Eu estava de quatro por ela, metaforicamente. E ela estava de quatro por mim, literalmente. Ainda antes de adormecer, alguns minutos antes do sol nascer, pensei: “É essa”. Outro erro.
 Acordei sozinho, com o sol a arder em meu rosto. Estava sozinho no quarto, que só naquele momento eu pude perceber que o era branco e estava praticamente vazio, exceto pela cama, pelo bidê e uma mala aberta, cheia de roupas nos pés da cama. Quando fiz os primeiros gestos para me levantar ela entra, vestindo minha camisa branca e, aparentemente, mais nada. Parecia um filme aquilo tudo, aquela mulher parecia não existir. Quando falou, tive de fazer força para compreender o que dizia, tamanha era a minha hipnose por seu corpo, jeito, rosto.
- Vai ficar pro almoço? – ela perguntou, sem me dirigir o olhar.
- Não sei, isso é um convite? – respondi.
Ela riu tanto com a minha resposta que quase fiquei constrangido. Quando finalmente conseguiu se recompor, ainda com ares de riso, disse:
- Não. É ironia, preciso sair – e, quando notou que eu não me movi, completou – e você também.
 “Ela deve ter seus compromissos”, pensei na hora. Então, vesti as jeans, as meias, os tênis e quando notei que estava sem minha camisa, olhei pra ela. Sem dizer uma palavra, mas fazendo uma careta, se virou, tirou a blusa ficando somente com a calcinha de algodão branca, me privilegiando com a vista das covinhas que tinha nas costas, os ombros e os cabelos loiros escondendo o pescoço. Ainda sem se virar, me atirou a camisa e vestiu uma blusa qualquer e um short que estavam em cima de uma cadeira, que mais servia de cabide, mas que eu não havia reparado até então. Botei a camisa e, enquanto ela me conduzia até a porta, fui tentando prender os botões, me deu tchau com um beijo na bochecha e quando vi, estava no corredor, com a calça pra dentro do tênis e com o zíper por fechar, a camisa mal abotoada e o cabelo e o rosto denunciando a noite que tive, mas que, não lembrava por inteiro.
 Esperando o elevador, pensei em voltar, pedir seu telefone, marcar de sair novamente ou perguntar seu nome, decidi que não, eu já havia deixado, anotado em um papel meu número. Quando a porta do elevador se abriu, vi um homem, um pouco mais velho que eu, com um buque de rosas vermelhas clichês à mão, vestindo uma camisa branca idêntica, não fosse a minha estar tão amarrotada. Com um leve aceno de cabeça saiu do elevador me dando passagem. Entrei. Apertei no botão do primeiro andar, me olhei no espelho, a felicidade e a euforia ainda se misturavam com a perplexidade que aquela mulher, menina, garota, sei lá havia instalado em mim. Então tive um baque, um turbilhão de pensamentos, me virei quase sabendo o que ia ver. O homem do buque de rosas clichês estava parado em frente da porta que eu acabara de sair.